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BLOGUE DO MANEL

A vida tem muito para contar e partilhar com os demais. Esta é a minha rede social para partilhar histórias, momentos e pensamentos, a horas ou fora de horas, com e sem pés nem cabeça. Blogue de Manuel Pereira de Sousa

BLOGUE DO MANEL

A vida tem muito para contar e partilhar com os demais. Esta é a minha rede social para partilhar histórias, momentos e pensamentos, a horas ou fora de horas, com e sem pés nem cabeça. Blogue de Manuel Pereira de Sousa

MENTIRA É UM PONTO DE VISTA?

Manuel Pereira de Sousa, 25.02.17

Mentira. Sei bem que vivo rodeado de mentiras – coisas da vida. Todos vivem rodeados de mentira. Estou habituado à mentira. Creio que todos estão habituados. É uma questão de sobrevivência. Mas, é triste se eu e qualquer um se habitua à mentira – cria-se e permite-se um mundo pior é mais promíscuo. É um mundo promíscuo aquele onde vivo. Notícias falsas, acontecimentos que nunca o foram, líderes que governam sobre a mentira para o bem próprio, empresas que vendem mentiras em vez de produtos, filosofias que pregam uma verdade sem nexo. Poderia continuar a lista de tudo o que me envolve e que está envolvido em mentira. Mas, para muitos poderei estar a ser incorreto. Porquê? Porque mentira para mim pode ser uma verdade para o outro – é a consequência da lei do relativismo. Tudo é relativo, até os grandes valores. Assim, a mentira tornou-se numa perspetiva ou ponto de vista que alguém tem sobre algo. O resultado de tudo isto são os constantes recuos da Humanidade.

EUTANÁSIA, O QUE TE DIZ ESTE ASSUNTO?

Manuel Pereira de Sousa, 02.03.16

Será o momento? Estaremos prontos? Vamos a debate? O que fazemos? Ignoramos? És a favor ou contra? Eutanásia, o que te diz este assunto?
Uma petição recente lançou o tema para a ordem do dia. Durante muitos anos falou-se, mas desviou-se do assunto. Nunca esteve na ordem do dia. Assunto melindroso. Implica discutir, pensar, saber o que fazer. Assunto que abana a consciência individual, que não pode ser debatido de ânimo leve. Mais polémico se tornou com as recentes declarações da Bastonária da Ordem dos Enfermeiros – polémica, dizer e desdizer que em Portugal se pratica eutanásia no Serviço Nacional de Saúde. Verdade ou mentira? Estará apenas na consciência dos profissionais de saúde.
Se o assunto está na ordem do dia, vamos debater, ouvir, pensar sobre a opinião que possamos tomar sobre o assunto – sejamos abertos. Falam alguns que não estamos em tempo de debater o assunto, há outras prioridades – que outras prioridades maiores que o debate sobre a vida e a morte de um ser humano? Aberta a caixa de pandora, não basta enterrar a cabeça na areia para ignorar o assunto – é preciso enfrentar com seriedade e discutir. Não é fácil fazê-lo? Não. Será sempre um assunto onde existem dúvidas, onde as decisões não serão tão claras e evidentes. Há que ter cuidados em legislar porque a vida é um bem de valor incalculável para decisões fáceis.

A propósito deste assunto, recomendo a leitura atenta do artigo “Sim, matei quatro pessoas e defendo a eutanásia”, publicado na revista Sábado, (já com alguns anos, creio). O texto é forte, com uma elevada carga emotiva porque quem cometeu a eutanásia foi uma pessoa com valores, sentimentos, dúvidas, receios. Não quero com este texto convencer ninguém, nem a mim mesmo, quero é que sejamos convidados a pensar, a estar na pele de profissionais de saúde - que se confrontam diariamente com o sofrimento e o pedido dos doentes - e dos doentes na sua fase de desespero. Oxalá que não tenhamos que passar pelas mesmas situações.

POSSO VIVER AUSENTE DO FACEBOOK?

Manuel Pereira de Sousa, 28.02.16

Não somos livres. Pelo menos como desejado. Pensamos ser livres, mas estamos presos. São as máquinas, as redes sociais, as outras pessoas que nos impedem das decisões que queremos tomar e queremos manter. Na realidade, vivemos reféns. Se num dado momento apago a conta do Facebook para me abstrair de tudo o que por lá se passa – muito barulho, muita conversa sem conteúdo, muito mau português, muita raiva, muita informação falsa e muita vida privada exposta clara e gratuitamente -, há uma série de pessoas, que bem intencionadas, tentam saber o porquê da ausência. É uma preocupação excessiva aquela que existe se alguém desaparece das redes sociais. Como se deixasse de existir quando não estou presente. Não somos livres. Vivemos presos ao virtual. Entre a justificação da saída e me manter por lá sem ter qualquer atividade útil, prefiro ficar por lá no sossego. Parece que estar lá significa estar bem, quando estou bem melhor se estiver ausente das redes – valorizo e dou atenção a outras coisas realmente mais importantes. Estar lá, em muitas pessoas é sinal de desespero, necessidade de afirmação, necessidade de personalidade. Não quero generalizar – nem todos são assim (ainda bem). Precisa a sociedade de ser mais livre, de ser menos condicionada, de olhar mais para o lado que para os ecrãs. Há tanta realidade que nos passa ao lado e desejamos entender a realidade que se passa num outro local qualquer. É bom ter consciência do que se passa no mundo, mas é triste se ignorar aquilo que está à minha volta, a poucos metros de distância. Conheço quem não está nas redes sociais. São pessoas com cultura, vida social, conhecem bem o que as rodeia – procuram fontes credíveis. Isto é ser livre.

E 2016 JÁ SE FARTARAM DELE?

Manuel Pereira de Sousa, 01.01.16

Ainda o ano agora começou e começo a ficar um pouco farto dele. Já me enchi de ouvir falar de 2016. Bastou estar no facebook uns momentos para ver como tudo deseja Bom Ano, Boas entradas, Feliz 2016. Todos a desejarem paz, amor, realizações, felicidade e uma mão cheia de coisas boas. Quem não deseja uma série de coisas boas?
Tantos posts eu vi do ano novo que poucas mensagens e telefonemas fiz este ano ou no ano passado, bastou colocar um like nos posts de toda a gente. Assim o autor pode ver que li e que retribuo as felicitações. Aqui e ali também escrevi uns comentários aos mais próximos.

Desejamos tanto que chegue o ano novo para nos livrarmos do velho que chegou igualmente cheio de festividades. Daqui a 12 meses vamos estar a expulsar 2016 – que agora é bem-vindo – para receber 2017 e assim por diante. Um ano parece ser muito tempo e as pessoas facilmente se queixam do ano, como se todos os anos fossem maus – acredito que em todos existam momentos positivos e menos positivos. Porque ignoram as pessoas os acontecimentos maravilhosos que receberam em 2015? E usem o pior para se dele livrar…

Ano novo poderia ser vida nova. Pelos vistos, no dia seguinte tudo continua normal com mais uma ressaca em cima dos festejos da passagem. Para ser vida nova teríamos a cada ano que passa, mudar radicalmente de hábitos, de casa, emprego, amigos, namorados, roupa ou uma tanta outra quantidade de coisas que marquem realmente uma nova vida. Mas, na realidade, continua tudo na mesma. São poucos os que mudam realmente para uma vida nova.
Até podem ter o hábito de fazer resoluções para 2016. Para quê? Duram quanto tempo? Uma semana ou duas ou um mês? Por isso, nada de resoluções. Vou fazer com que cada dia seja o dia próprio em que procuro realizar cada projeto e cada desejo, dependendo das ocasiões e das oportunidades que se criam. Para quê criam resoluções se depois ficamos frustrados se não as atingimos? É por estas e por outras que depois as pessoas se cansam do ano e desejam ansiosamente que segue a passagem de ano – como se fosse um ritual de exorcismo.

Prefiro que se comemore cada dia o facto de estar vivo.

A CORAGEM DE LAURA FERREIRA NA LUTA CONTRA O CANCRO

Manuel Pereira de Sousa, 19.07.15

Há dias vi de passagem uma imagem de Laura Ferreira, esposa do nosso Primeiro-Ministro, em público sem cabelo. Sabia já que esta senhora estava numa luta contra um cancro e facilmente percebi a razão de estar sem cabelo. A notícia queria no fundo questionar até que ponto deveria Laura aparecer publicamente sem um lenço, uma cabeleira, para tapar a nudez do crânio. Questionava-se até que ponto poderia faze-lo sendo ela uma personalidade pública e, por isso, ter intenções de retirar proveitos políticos para o seu marido. Ao princípio ignorei porque a liberdade de cada um aparecer em público com uma determinada aparência é inquestionável, qualquer que seja a importância social dessa pessoa.

Mas, como em tudo, fizeram-se diversas leituras a gosto de cada oportunidade e pelos vistos o caso continuou a ser escrutinado como se qualquer cidadão tivesse direito de o fazer – assim ditam as regras da liberdade de expressão. É importante distinguir o que é público e o que é privado. O que é público deve ser questionado, escrutinado, investigado e justificado porque diz respeito a todos; o que é privado deve assim ser aceite. Não se preocupem os arautos da crítica quanto à consequência política que o caso de Laura pode provocar nas legislativas que se aproximam. Querer afirmar que há um aproveitamento político é um pensamento, no meu entender, mesquinho. É difícil quantificar os votos que a coligação conseguirá angariar fruto da pena e da desgraça de alguém. É utópico. É uma perda de tempo. A batalha política deve centrar-se noutros rumos, noutros dados, noutras propostas. Assusta-me quando as máquinas partidárias tentam, a qualquer custo, ao de leve e de forma inocente lançar lume na vida privada de alguém, para que o povo acorra a incendiar ainda mais.

 

Acima de tudo, é importante referir que: Laura Ferreira é uma mulher forte. Não tem que sentir vergonha, constrangimento, por publicamente mostrar as cicatrizes de uma doença que deixa marcas e muito sofrimento. A revista “Visão”, desta semana, fala das mulheres que negam ter de andar com uma cabeleira ou com um lenço para tapar aquela nudez, a falta de longos e belos cabelos que é muito característico da mulher. Vergonha que as outras pessoas olhem? – pois que olhem. De chocar? – pois que choque. A realidade não pode, nem deve ser escondida. Acredito que para um homem seja fácil estar sem cabelo, muitos até o rapam, muitos são carecas. Para uma mulher, a perda de cabelo é um desgosto e uma marca que deve ser profunda, assim como profunda é a falta de um seio – difícil de recuperar. Cabelos, seios e tudo o resto que se extrai são partes delas e deles que sofrem com o cancro. Sofrem – talvez ainda poucos tenham a noção do sofrimento. Quantas mulheres sentem a vergonha de si? Quantas têm dificuldade de se olhar ao espelho, para encarar o seu corpo marcado por uma doença que quer matar aos poucos? Quantas só sentem que podem ser elas em casa, longe dos olhares alheios? Quantas escondem com as roupas o sofrimento, que se manifesta em casa, sozinhas e, muitas vezes, sem apoio? Porquê vergonha de mostrar a careca?

Lembro-me do artigo de Henrique Raposo, no semanário “Expresso”, desta semana, quando diz que não têm que sentir vergonha as mulheres alvo da desgraça que lhes aconteceu. Não se deve ter vergonha de algo que não foi desejado, nem tão pouco provocado por elas. Ficar sem um seio, o cabelo ou ter qualquer outra cicatriz é sim um sinal de: CORAGEM. Coragem porque se luta pela vida. A estas pessoas deseja-se coragem, força, energia e que não deixem de acreditar que podem voltar a viver com qualidade de vida e felizes. Não se perde a beleza com a falta de cabelo, mas conquista-se o reconhecimento pela força. Não olhem para alguém que usa o lenço com pena; SORRIAM. Não façam festinhas com lágrimas: agarrem com força e digam: ÉS UM(A) GERRUEIRO(A). Ainda bem que Laura Ferreira tomou esta atitude. De algo que é pessoal e da vida privada, tornou público, falado e comentado, para que o assunto não fique só em pequenas conversas, mas seja exposto, para que as mulheres e os homens sintam a coragem de trazer para a rua o sofrimento que escondem em casa - só para fingir que está tudo bem quando não está.

 

Laura Ferreira é uma mulher com coragem e ainda bem que os holofotes ficaram sobre si, para que também de fora venha o conforto das palavras e das pessoas para sentir otimismo na luta contra esta doença. Parte da luta contra o cancro vem da energia positiva que os outros possam dar; nem que seja para minimizar um pouquinho o sofrimento; nem que seja para acreditar e para ter esperança; nem que seja para se ter força para aquele tratamento tão doloroso. O que pensará um doente com cancro quando toda a gente está ali a dar força, naqueles momentos dolorosos? VOU VENCER!

O QUE SERIA DE MIM SEM A ROTINA?

Manuel Pereira de Sousa, 09.05.15

Há alturas da vida que me canso daquela rotina e da correria desde o levantar até ao chega a casa - às vezes, até ao deitar. Mas, o que seria de mim sem essa rotina? Faz falta. Quando não a tenho sinto falta dela. Por exemplo, quando a doença impede a rotina e me obriga a parar: fico farto. Fico desejoso por voltar à rotina de antes. A rotina é vida. Para outros acredito que a rotina seja a morte lenta. São as escolhas que fazemos e as oportunidades que temos. A que propósito me lembro disto? A simples razão de me ter sentado naquele café do costume e sem ter pedido nada, a funcionária traz-me gentilmente o café curto. Já sabe. Nem preciso falar para além de um: obrigado. O mesmo acontece num outro sítio em que a determinada hora do dia, o funcionário do costume me traz o café, o pastel de nata e o copo com água. São hábitos, rotinas. Isso revela que sou previsível? Talvez. Pelo menos sabem com o que contam… Essa rotina faz com que em determinadas alturas, em que a quero quebrar, tenha de ser eu a correr em direção ao funcionário dizer-lhe que quero outra coisa – não vá ele trazer em vão o que não quero e tenha de fazer novo percurso. A vida tem sempre rotinas, por muito que se tentem contrariar. Acordar, o banho, lavar os dentes, comer, olhar o telefone, ver os e-mails, ouvir as notícias, comprar o jornal, fumar depois do café, aproveitar as promoções do supermercado, deitar. São tudo rotinas. As que nos dão prazer não nos queixamos, as que dão dor de cabeça são terríveis.

O que seria da minha vida sem uma dose de rotina? O mesmo que sem uma dose de cafeína, o mesmo que sem uma dose de palavras escritas, o mesmo que sem umas linhas lidas do jornal ou de um livro. Por vezes, desejo sair da rotina, mas sabe tão bem estar imbuído nela. Trata-se de uma forma de viver embriagado – embriagado na vida.

HÁ QUANTO TEMPO NÃO OUVES O CUCO?

Manuel Pereira de Sousa, 03.05.15

“Aos anos que não ouço o Cuco” – expressão dita por um homem de meia idade para outro enquanto caminham ao longo da rua. De imediato me questionei: Há quantos anos não ouço o Cuco? Bem… Não consigo lembrar-me do tempo, mas sei que há uns tempos ouvi o cuco, não me lembro aonde, mas sei que não foi assim há tanto tempo.

A falta da natureza tem destas coisas. Há sons que estão na nossa memória como recordação porque são sons cada vez mais raros, sobretudo para quem vive nas cidades – como eu. Quantos já não se lembram do som do Cuco? Quantos nunca ouviram o cuco? Quantos só têm a memória desde os tempos de, em nossas casas, haver um relógio que a certa altura lançava o Cuco da gaiola. Sons que a modernidade vai apagando do quotidiano e que apenas permanece na memória de alguns.

Neste momento, acabo por sentir falta do campo, da sua calma, dos sons da natureza e das paisagens que me enchem a vista e me fazem sentir relaxado. As cidades têm a sua graça, mas é diferente. E vós, há quanto tempo não ouvem o Cuco?

O ENCONTRO NA ESTAÇÃO DE COMBOIO: O AMOR VIVE DA SAUDADE.

Manuel Pereira de Sousa, 15.02.14

Caminha em passo acelerado pela rua fora com uma determinação que ninguém lhe tira, nem os buracos do passeio a fazem tropeçar como às outras pessoas, nem as pessoas que caminham em sentido contrário lhe travam a rota que mentalmente traçou para si com o objetivo de chegar a um lugar; continua a andar em passo decidido e quando alguém caminha mais à frente, em passo mais lento, desce para o alcatrão e acelera para voltar a subir para o passeio e continuar o seu caminho. Já caminha há longos minutos, por uma cidade apinhada de gente e onde o barulho dos carros, dos autocarros, das ambulâncias jamais são capazes de tirar do seu momento de concentração. Chega a um largo, onde os automóveis fazem fila num para e arranca constante, os táxis chegam e partem a toda a hora e os autocarros são contantes a trazer e a levar pessoas, como se tratassem de mercadorias. Num largo tão movimentado apenas há um pequeno espaço, no passeio, com uns bancos onde se encontram os velhos reformados do costume que passam o seu tempo a admirar toda aquela corria de pessoas que entram e saem daquela estação de comboios. Sim, a mulher caminha em direção à estação de comboios, era aqui que queria chegar neste seu andamento tão apressado.
Passa a entrada principal da estação e olha de frente para o painel dos horários de partidas e chegadas, olha para o seu relógio porque o velho relógio da estação parece ter parado no tempo e só está certo duas vezes ao dia, de seguida olha para as linhas e: não está nenhum comboio – chegou a tempo. Caminha novamente em passo mais lento, chega até ao pé da linha e senta-se num banco à espera, não sabemos do quê - também nós temos de aguardar para perceber qual o motivo desta espera.
O tempo vai passando e a cada minuto mais pessoas vão chegando ao mesmo sítio e ficam na mesma espera. Falta um minuto para as oito da noite e lá ao fundo vem um comboio, ela levanta-se num ápice e acompanha com o seu olhar a sua chegada, sente-se a sua inquietação e um certo estado de ansiedade, como se o coração saltasse por dentro. O comboio chega, abranda o seu ritmo até parar e rapidamente se abrem as portas.

Horas antes, numa outra estação, num outro lado do país, um jovem  está sentado num banco com uma mochila a seus pés; está calmo, com uma aparência tranquila olhando para a linha de comboio e acompanhando com o seu olhar até ao horizonte e a perdê-la de vista. Ao seu lado está um homem com alguma idade, denunciada pelos cabelos brancos, que lê o seu jornal de forma descontraída como se nada passasse à sua volta – de facto nada se passa. O local é calmo, poucas pessoas ali permanecem naquela estação. Entretanto, no sentido oposto, ouve-se um barulho de um comboio que se aproxima e para diante daqueles dois que estão no banco. O jovem e o outro homem levantam-se e entram no comboio. A tarde ainda está a começar e para o jovem há longas horas de viagem pela frente e muitas paragens em vários apeadeiros. O comboio arranca e segue a sua viagem com passagem por diversas terras, lugares cheios de gente e outros em que não se vê viva alma, atravessa por campos, rios e uma série de sítios que a voz do comboio vai mencionando a cada aproximação de paragem e em cada paragem, mas, o jovem deixa de aperceber por onde passa porque fecha os olhos e faz grande parte do trajeto a dormir com os phones nos ouvidos, a ouvir uma música qualquer. Entretanto acorda e repara que já passou algum tempo porque o sol já está a desparecer no horizonte; olha para o relógio e repara que falta pouco para a chegada; movimenta-se no banco para ajeitar as costas e nota-se que a sua tranquilidade vacilou um pouco e um ar de ansiedade está patente no seu rosto. Ao fundo da carruagem está o revisor que vem na sua direção. Boa tarde, o seu bilhete, por favor, há pouco não o quis acordar. O jovem sorriu, agradeceu, meteu a mão ao bolso e tirou o bilhete para o revisor picar. Obrigado – disseram em coro. O revisor lá foi, até à outra carruagem.
A noite já caiu, o destino está muito próximo, já se vê as luzes da cidade lá ao fundo. O jovem fica ansioso, nota-se que agora acordou mesmo. A voz anuncia a chegada da última estação e todos se preparam para sair. Chega o comboio ao destino, numa estação cheia de gente à espera daquele comboio. O jovem pega na sua mochila e ansiosamente espera que a porta abra, que o comboio pare – estes últimos momentos parece que nunca mais terminam. As portas abrem e todos saem.

A mulher vê tanta gente a sair, estica-se em bicos de pés, para encontrar alguém. No meio das pessoas estava um rapaz a fazer a mesma coisa. De repente, os olhares do jovem e da mulher cruzam-se e fixam-se por momentos, segundos, que se tornam uma eternidade, e sente-se a passagem de uma corrente entre os dois, que ambos caminham na direção um do outro como se entre eles não existisse mais ninguém. Chegam ao pé um do outro e abraçam-se intensamente, beijam-se com uma vontade tão grande como se esse estivesse guardado há tanto tempo, para este momento e encontro deste jovens namorados, na estação de comboio. Entre beijos sucessivos curtos e longos, nota-se um crescente alívio da ansiedade que ambos estavam a sentir com a chegada à estação; as suas faces unidas pelos lábios esboçam um grande sorriso e uma grande ternura entre os dois - não há palavras que o consigam descrever este momento e este sentimento que os une, imaginem e sintam.
O mesmo homem de cabelos brancos que estava na paragem, no mesmo banco que o jovem, a ler o jornal é a única pessoa que está a ver este momento e a aprecia-lo com uma grande admiração e um sorriso de saudade como se em outros tempos também tivesse vivido um momento assim. Todas as outras pessoas estavam apressadas demais para reparar neste momento – acham isto muito vulgar. Aquele momento entre os jovens durou ainda algum tempo, tanto tempo que o comboio partiu novamente para trás, para outra viagem e, com a sua ida, aquela linha estava a ficar despida de gente, a ponto de ficarem poucas pessoas para além dos três. O homem de cabelos brancos que apreciava tudo aquilo estava novamente sentado com o jornal na mão, desta vez com ele dobrado, pois ainda estava contagiado pela cena. No momento em que os jovens param de beijar e começam a dizer as primeiras palavras, o homem de cabelos brancos começa a falar: Agora percebo a sua ansiedade meu jovem; quem não estaria ansioso sabendo que iria viver um momento tão intenso como este; recordem sempre deste momento para o resto das vossas vidas, pois será este que vos fará sentir bem, mesmo naqueles dias em que tudo corre mal e andamos caídos; este momento faz ressuscitar muita coisa na relação de duas pessoas e na vida de cada um; o amor é coisa rara nos dias que correm, mas onde existe manifesta-se de uma maneira tão pura e tão simples. Os jovens coraram, mas não esconderam um sorriso de aprovação meio desajeitado. Perguntou o jovem: o senhor estava comigo na outra paragem a ler o jornal e aqui está sentado novamente a ler o jornal, o que espera? O homem, voltou o rosto para o horizonte, sorriu, ficou em silêncio uns instantes e com umas lágrimas escondidas disse: há anos que espero em muitas estações deste país por alguém que julgo não vir mais; aquilo que vocês vivem hoje, vivia eu na minha juventude, esperava três vezes por ano pelo comboio que trazia a mulher da minha vida, mas um dia esse comboio teve um acidente muito grave, morreram todos, e eu perdi-a para sempre; quanta amargura e saudade desde esses tempos; hoje o comboio traz a saudade para que eu ainda consiga viver, pois dela me alimento; o amor vive da saudade.



QUAL O TEU OBJETIVO PARA HOJE?

Manuel Pereira de Sousa, 11.02.14

O nosso dia-a-dia tem de ter sempre um objetivo, que deve ser traçado a cada dia que começa, só assim conseguimos que no final possamos ter a sensação de dever cumprido – assim se pode lutar contra a monotonia ou contra o desleixo em que nos deixamos ir na vida, e no final nos deixa sentir fracassados ou impotentes.

Esta foi uma lição que deixei no meu dia de trabalho a um colaborador, que manifestou a dificuldade em fazer mais e melhor e com isso de provar que é bom, que quer manter o seu lugar e sentir-se útil na empresa. Notei nesta preocupação uma falta de orientação e um rumo a seguir – poderia eu dar-lhe esse rumo, dizer-lhe todo o caminho, mas sabia que só isso não chegava. Se eu lhe mostrasse o caminho e a meta lá ao fundo e o deixasse ir sem mais qualquer orientação, sei que esse colaborador iria chegar a meio vencido pelo cansaço, com desalento e cairia na mesma monotonia de sempre – enquanto isso, os outros continuariam a passar-lhe à frente.

Mas, qual a solução a dar-lhe? Como o fazer chegar ao fim desse caminho? Para além de algumas dicas para a caminhada, sugeri que estabelecesse um objetivo no início de cada dia de trabalho – algo que seja real e seja possível de atingir. Cada dia que passa um novo objetivo deveria ser definido, sempre mais e mais exigente, mas de forma que o trajeto seja feito de forma consistente e seguro. Tal como no desporto, em cada dia se estabelece mais uns quilómetros, mais um exercício, para que o recorde pessoal seja um estímulo a avançar.

A vida é mesmo assim, caminhar com um objetivo que nós estabelecemos e que só nós somos capazes de definir e atingir por muito que nos digam qual o caminho a percorrer – só assim resulta.

E tu, qual o objetivo para hoje?