Por: Manuel de Sousa 

Numa altura em que o jornalismo é atingido por diversas crises que tentam diminuir a sua importância e limitar a sua acção, valerá ler as palavras de um profissional com 45 anos de carreira ao serviço do jornalismo, que o encarou como uma missão e não como uma profissão. Gilberto Ferraz, uma voz portuguesa na BBC durante três décadas, mas ao mesmo tempo correspondente português em Londres para o JN, TSF e para a RTP. Acompanhante dos desenvolvimentos do jornalismo português dá-nos a sua opinião sobre os abusos cometidos para controlo da liberdade de imprensa, a tentativa de manipulação e dominação da comunicação social por grupos de interesses, o papel do Serviço Público de Televisão exercido pela RTP e uma visão do futuro da Imprensa em papel com a massificação da Internet e das edições on-line. Uma leitura, espero de bom agrado, que merecerá nossa reflexão sobre temas que preocupam aqueles que acompanham os acontecimentos dos media e as formas de como a comunicação evolui ao longo dos tempos.




 




Manuel de Sousa - Apesar de não se encontrar no nosso país, deve acompanhar os desenvolvimentos de alguns acontecimentos cá em Portugal. Como vê o recente caso da ligação do Primeiro-Ministro José Sócrates e a comunicação nacional, em que existem suspeitas de tentativas de controlo e pressão sobre repórteres e mesmo sobre as direcções editoriais?

Gilberto Ferraz
- Hábito de há 45 anos, em que ouvia diariamente a antiga Emissora Nacional, e em que na madrugada de 25 de Abril, acompanhei, par e passo, todos os acontecimentos até às 05 da manhã, mantenho o elo diário com o que se passa no nosso país. Além disso, estou em contacto físico ou em visitas pessoais frequentes ou, em família, pelo menos uma vez por ano, em que viajo de automóvel e passo, agora, pelo menos, dois meses no nosso apartamento em Cascais. Como veterano da comunicação social, mas melhor, profissional da BBC durante três décadas, uma emissora zelosa e ciosa da sua independência do Estado, considero, e sempre pugnei em artigos na imprensa Portuguesa, que quer governos, quer partidos, devem estar totalmente desligados, ou não interferirem nos órgãos da Comunicação Social, que devem gozar de completa isenção, influência ou pressões de governos. Por isso, em relação aos alegados e tristes episódios que, segundo as notícias conhecidas, o actual primeiro-ministro terá tentado influenciar ou controlar; a ser verdade, condeno totalmente semelhante comportamento só existente nas chamadas Republicas das bananas.




MS - Considera que perante os factos tornados públicos e as suspeições levantadas estará a comunicação social ameaçada pelo partido do Governo? Existem provas ou evidências que indiquem que a comunicação social está em perigo?




GF - Claro que, venha a ser provado, obviamente não é apenas a comunicação social que está em perigo, mas a própria Democracia e a Liberdade de Expressão do nosso País!. Em relação à minha carreira na BBC, cito dois importantes episódios: Um, aquando o então primeiro-ministro, Anthony Eden, empenhado na invasão do Suez procurou "amordaçar" a independência da BBC a transmitir o que o governo pretendia, o que não sucedeu devido à posição tanto do então Director Geral, como do próprio pessoal. Tentativa idêntica foi feita aquando da Guerra das Falklands. Como a BBC recusasse, o Ministério de Defesa do período foi obrigado a estabelecer um canal próprio em que transmitia pura, mas quanto a mim, suja propaganda, de que fui própria testemunha!




MS - Em Portugal temos a Impresa de Balsemão e a tentativa de Media Capital pertencer ao PS. É legitimo que um partido político ou Governo sejam detentores de um grupo de comunicação social? Em que moldes poderá existir essa possibilidade?




GF - Pelo que afirmei acima, discordo plenamente que tanto partidos, como governos, sejam possuidores de grupos, ou influência directa em órgãos da comunicação social.




MS - Uma televisão como a RTP deve ser mantida sob a esfera do Estado como empresa pública ou deverá ser privatizada, dado que se torna dispendiosa para p Erário Público? Existiria alguma possibilidade do serviço público de televisão ser distribuído por conteúdos pelos canais privados?




GF - Obviamente, aqui o melhor exemplo é a BBC. A emissora britânica tem estatuto próprio (Charter), que é renovada quadrienalmente. Embora subsidiada, na sua maioria, pela taxa da televisão, é editorial e totalmente independente, sendo responsável ao público contribuinte das taxas, aqui em termos de "stakeholders", e, como intermediário, em representação do povo britânico, ao Parlamento, a quem anualmente apresenta as suas contas e responde pela sua gestão. Além disso, e quando especialmente criticada quer pela imprensa de direita, mas especialmente a que está relacionada com as empresas de Rupert Murdoch, como a Sky, The Sun, etc. que ao zelar pelos seus interesses, mas não só, não faz outra coisa que atacar a que é não só emissora, mas instituição de cultura britânica. Em relação à RTP, na situação actual, subsidiada com publicidade, acho que deva ser privatizada, uma vez que está em directa concorrência com os canais comerciais. Caso contrário, ao ser financiada (em sua maioria) pelo Estado, deveria ter estatutos de Entidade Pública, mais ou menos nos moldes da BBC. Em relação aos conteúdos, deveria pautar-se por assuntos que as concorrentes geralmente não cobrem, como, e especialmente, de carácter educacional e informativo.




MS - Existe, nos dias de hoje, a possibilidade dos media serem independentes do poder político e económico ou terão que se subjugar dada a dependência dos meios financeiros e do estrangulamento económico que podem sofrer quando atacam os poderes instalados?




GF - A resposta a esta questão, pode ser encontrada, em parte, nos parágrafos e considerações anteriores. Para que a informação seja isenta e fidedigna, como se deve esperar, insisto na necessidade de completa independência de quaisquer poderes, quer, como afirmei antes, políticos, financeiros ou de "lobbies" organizados.




MS - Qual a sua opinião sobre a qualidade do jornalismo praticado em Portugal? Estará o Ensino a formar profissionais credíveis e capazes de praticar um jornalismo sério, credível e com profissionalismo?




GF - Observador atento ao sector e, como no início da minha carreira jornalística para Portugal (Jornal de Notícias e TSF, os quais servi, o primeiro durante 27 anos, ainda ao serviço da BBC, mas com autorização desta, e a segunda, 10, quando deixei oficialmente de exercer as minhas funções profissionais), devido às então limitações do sector, ou meios jornalísticos do nosso país, procurei pautar o meu trabalho de uma forma didáctica, o que foi reconhecido, apreciado e até oficialmente louvado. Actualmente, graças a outros meios, nomeadamente a internet, o ónus reside mais nas instituições académicas e formação de jornalistas. Neste domínio, e em relação ao nosso País, escuso pronunciar-me, uma vez que não estou, como desejaria, totalmente apto a fazê-lo. Porém, ao longo da minha carreira e observando colegas Portugueses e, mais recentemente em termos de trabalho, produzido nos actuais órgãos da comunicação social, obviamente as carências são visíveis. Além disso, não é apenas uma questão académica, mas a latente ausência de civismo e de espírito de responsabilidade, dos que deveriam ser profissionais, não obstante os regulamentos deontológicos.




MS - Como compara o jornalismo que se pratica em Portugal com a generalidade dos países da Europa? Estaremos muito distantes práticas Europeias?




GF - Além do exposto anteriormente, uma das grandes falhas numa boa parte dos profissionais da informação do nosso país é: a) arrogância, ao pretender superiorizar-se em relação à sua audiência, tratando-a muitas vezes com desdém; b) desnecessária incompatibilidade e inimizade com colegas, particularmente aqueles com mais competência e idoneidade; c) este, aliás, um mal encorajado pelos próprios gestores que, talvez por razões económicas preferem as novas, mas impreparadas, gerações e d) a falta de profissionalismo dos próprios jornalistas que desrespeitando as fontes, e procurando manchetes, geralmente não observam a confidencialidade.




MS - Como compara o tipo de público que português com o público europeu, em termos de exigência na qualidade de informação e na frequência com que procuram informação?




GF - Neste domínio, tudo se resume em maturidade democrática e amor pela leitura. No caso do nosso país, em que só recentemente os níveis de alfabetismo evoluíram, embora, como sabemos, nos grupos etários mais velhos se mantenham grandes e indesejáveis iatos, permanece o grande vácuo do amor e hábito da leitura, o que, obviamente se aplica aos jornais. E, num mercado restrito como o nosso, em que as circulações são ínfimas, obviamente o preço tanto dos jornais como, mas pior ainda, dos livros, por serem exorbitantes, mais desencoraja o amor pela leitura, recorrendo-se à imagem, à televisão, uma televisão baseada ou em telenovelas ou em concursos pouco estimulantes do intelecto. Portanto, neste domínio, comparado à experiência, particularmente britânica estamos ainda a anos de luz de distância! Mas, acrescento, em termos tecnológicos, as nossas televisões são excelentes!




MS - Quais as principais diferenças que encontra na prática ou no exercício da profissão nos tempos em que iniciou a sua carreira e os actuais?




GF - Obviamente, as maiores, as enormes diferenças, residem na tecnologia e na facilitação da notícia! Em termos de imprensa, cito um exemplo pessoal. Aqui, no Reino Unido, particularmente os órgãos estrangeiros, especialmente os grandes ou médios títulos, ao possuírem estruturas próprias, como escritórios e equipamento adequados, não dependiam, como a maioria dos correspondentes, em que eu e muitos outros nos encontrávamos dos meios públicos então existentes, como era o telex. O único, a cargo da então nacionalizada Companhia dos Telefones, na altura, aliás muito perto do Serviço Mundial da BBC, no Strand (perto da City de Londres). Quando a já privatizada British Telecom decidiu acabar com este serviço, o único no país, e o único meio da maioria dos correspondentes mandarem os seus trabalhos para o exterior, reagiram, montando uma notável campanha de que eu fui nomeado presidente, envolvendo órgãos britânicos da comunicação social, embaixadas, presidentes e primeiros-ministros dos países representados, enquanto cartas de protesto e contactos com ministros britânicos, incluindo a então própria primeira-ministra, Margaret Thatcher Felizmente fomos bem sucedidos mantendo-se aquele serviço até ao aparecimento dos faxes e dos e-mails! Além disso, a tecnologia e revolução na imprensa, que da composição a quente chegou à actual computorizada, incluindo a revolução a cor. No domínio da rádio, o abandono das tediosas e irritantes montagens, para a tecnologia digital, e, da televisão, a enorme possibilidade do envio de fotos e reportagens via satélite!




MS - Fala-se na crise da Imprensa e na possibilidade de, num futuro próximo, deixarmos de ter o formato em papel. Da mesma forma que se falava no fim da rádio com o aparecimento da televisão ou no fim da televisão com a chegada da internet. A televisão e a rádio adaptaram-se e ainda aí estão. Os jornais terão capacidade de se adaptar?




GF - A adaptabilidade tanto da imprensa, em relação à televisão, já é de todos conhecida. Obviamente a circulação baixou drasticamente, mas não morreu. Aqui no Reino Unido e, na maioria dos países de grande nível de leitura, a maior adversária tem sido a internet, levando ao fecho de grandes e conceituados títulos. A posição actual, como é o caso da News International, em que a partir de Junho começa a cobrar aos utentes pela consulta das e edições digitais, poderá ser a norma. Mas em princípio poderá não singrar, prevalecendo a consulta gratuita na base de apoios publicitários, iniciativas em que as edições digitais dos principais matutinos terão que se adaptar e aperfeiçoar. Mas em países como a Índia e a China, não obstante o aumento da internet, a imprensa predomina. No tocante às televisões, evidentemente, embora a recolha e divulgação da notícia continue a ser altamente proibitiva, muito terá de ganhar com a internet, tanto em termos de recolha como de divulgação da notícia.




MS - Considera normal que num país como o nosso existam tão poucos leitores de jornais comparados com outros países Europeus como a Espanha e a França? Acha que existe a possibilidade de se alterar o rumo?
GF
- Além do que afirmei anteriormente, acrescento que com o aumento do alfabetismo, no nosso país há uma grande possibilidade de se alterar a situação. Compete aos principais títulos montar campanhas a nível escolar, de difusão da leitura e do amor aos jornais. Trata-se de uma questão de gestão e promoção. A outros níveis, iniciativas e apoios da imprensa a nível particularmente local e regional, sem dúvida que muito contribui. Aliás, neste domínio o JN, tanto a nível escolar como de promoção com a atribuição de prémios, tem sido um dos pioneiros.




MS - Qual a sua posição perante a distribuição de jornais gratuitos em Portugal, tendo como exemplo a elevada contestação que se gerou em França e os problemas ambientais que se sucederam (lixo nas ruas e esgotos entupidos). Pelos dados existentes, as publicações gratuitas tiveram um crescimento, mas será num curto espaço de tempo?




GF - Há alguns anos, portanto muito antes dos actuais Destak e Metro, estive interessado em envolver-me e lançar a ideia em Portugal. Obviamente os jornais gratuitos têm desempenhado um papel importante na difusão da leitura. Pecam, porém, pela escassez de estrutura editorial, mas pior ainda, como aponta, constituírem uma enorme ameaça ambiental. Aqui em Londres, onde existiam vários títulos gratuitos, apenas um (Metro) prevalece, embora o vespertino The Evening Standard, que era pago, é actualmente grátis. Porém, prevalece o problema ambiental, em que as câmaras e as companhias dos transportes fazem campanhas para que os leitores não deixem os jornais nos transportes, o que infelizmente não acontece.




MS - Quais as limitações, virtudes ou defeitos que os jornais podem na versão online?




GF - As limitações são mais de conteúdo e, claro, tudo depende dos investimentos que são feitos para a sua melhoria. O exemplo britânico é muito sui genneris, destacando-se principalmente o The Guardian On Line, mas acima de tudo a BBC que possui um dos melhores e mais completos serviços digitais ao ponto de, mais uma vez, ser o magnate Murdoch a impor-se e a montar uma enorme campanha ao ponto de obrigar a BBC a reduzir este seu serviço completamente grátis!




MS - Dizem críticos que para a versão papel existir os jornais terão de deixar de noticiar o que aconteceu ontem e passar a noticiar sobre o que vai acontecer amanhã. Terão de ter uma outra filosofia. Acha que assim tem de ser?




GF - Não necessariamente, mas neste domínio a imprensa britânica tem-se notabilizado já há vários anos. Aliás, as revistas noticiosas, nomeadamente a americana TIME e a britânica The Economist, são excelentes exemplos. Claro que este tipo de reportagem exige e depende muito de altamente especializados jornalistas, o que quer dizer custos elevados.




MS - Alguma vez sentiu pressões por parte de direcções ou poderes externos sobre o seu trabalho?




GF - Na BBC, nunca! Aqui cito, de novo, um exemplo pessoal. Estávamos em 1997, ano de várias greves durante o governo de James Callaghan. Como na altura se dependia largamente em artigos da Directoria Central, portanto usados e traduzidos (mas, atenção, não adaptados ou resumidos) pelas 42 secções, veio-me à mão um artigo para a edição daquele dia, altamente tendencioso em que alegava que as greves estavam a proliferar e quase a paralisar o país. Contactei os respectivos serviços e apontei o problema, pelo que me foram dados todos os poderes para, embora dando a notícia, transmitisse a versão por mim considerada correcta. O que foi feito! Quanto ao meu trabalho com o JN, embora tivesse sido sempre respeitado e apreciado por vários e inúmeros directores e leitores que o faziam através de correspondência pessoal, infelizmente, surgiram problemas com colegas, não a nível editorial, mas de carácter logístico, que me levaram a considerar a minha resignação. O que lamentavelmente tive de voluntariamente, e a título pessoal, fazer.




 MS - Qual o conselho que deixaria aos jornalistas portugueses?




GF - Numa honrosa capacidade e responsabilidade como o jornalismo, não deve ser encarado como profissão, mas missão. Por isso ser fiel tanto às fontes, mas especialmente às audiências e NUNCA, MAS NUNCA, ceder a pressões, sejam elas de quem venham. Além disso, pugnar pela isenção, conscientes dos nossos próprios defeitos e percepções pessoais.





Estas e muitas outras experiências de 45 anos de profissional e vivência, bem como observações, constam no manuscrito a publicar, intitulado Por Terras de Sua Majestade.




 




 A HISTÓRIA DE GILBERTO FERRAZ

Por: Manuel de Sousa




Gilberto Ferraz foi uma grande voz portuguesa da BBC, talvez menos conhecida entre nós que outras vozes como Artur Agostinho ou mesmo Fernando Peça. Porém, o protagonismo de Gilberto é ultrapassa as barreiras da BBC e foi bem presente no jornalismo português, ainda que continue a viver em Londres. Achei por bem dar-vos a conhecer este homem do jornalismo, que apesar da sua ausência física no nosso país, é um acompanhante de tudo o que por cá vai acontece e além disso, ainda nos conta as suas histórias de 45 anos de carreira e nos dá a conhecer trabalhos jornalísticos que vai desenvolvendo no seu dia-a-dia. Neste momento, Gilberto Ferraz é autor de um conhecido blogue no Jornal de Notícias, o Glifer, com artigos da Terra de Sua Majestade e não só. Podemos também encontrar artigos de opinião na edição on-line do Jornal Destak e mesmo na edição on-line do Diário Económico. Com 76 anos de idade, contínua com uma movimentação genial no jornalismo, onde existe uma colaboração com a Rádio Contacto Road Show, em Londres. É solicitado actualmente pelos media britânicos e mesmo internacionais, BBC, ITV, Sky News, jornais The Daily Express, The Times, para comentar assuntos relacionados com Portugal (entre eles destaca-se o desaparecimento de Madeleine McCain e defendendo Portugal dos ataques perpetrados pelos media britânicos).
Ligado à família política do PSD, onde desempenhou a função de Presidente entre 1979 e 1990, na Seccção do PSD na Grã-Bretanha e onde destacamos a sua mensagem de parabéns pela eleição de Pedro Passos Coelho para a presidência do PSD, no site oficial do Partido. Na sua luta política destaca-se a posição influente que exerceu aquando o Partido Socialista teve a intenção de pôr termo ao Voto Postal da Emigração.
Por toda uma carreira de 45 anos de jornalismo activo, foi agraciado em 1995 com a Comenda de Mérito por «altos serviços prestados ao jornalismo».
Gilberto Ferraz, nasceu em Tondela, a 9 de Fevereiro de 1934 e foi para Lisboa com 12 anos de idade. Desde muito novo que manifestou o seu interesse pelos acontecimentos nacionais e internacionais, inclusive pelos assunto relacionados com a II Guerra Mundial como o julgamento dos dirigentes nazis, durante os Julgamentos de Nuremberga. Em Lisboa, converte-se ao protestantismo e começa a trabalhar como jornalista no quinzenário «Espada do Senhor» onde desempenhou cargo de chefia durante cinco anos.
Em Agosto de 1965, vai para Londres, para o Serviço Mundial na BBC, inicialmente com um contrato de quatro anos, mas por lá trabalhou cerca de trinta anos, na secção portuguesa e na secção brasileira. A par da sua profissão como jornalista de destaque, foi fundador e responsável pelo Departamento de Estudos de Audiência de Língua Portuguesa. Por lá se cruzou com notáveis da comunicação como Joaquim Letria e José Rodrigues dos Santos.
Exerceu funções voluntariamente, durante seis anos, o posto de Vice-presidente da ABS (Association of Broadcasting Staff ? Sindicato) e mais tarde na vcbhBECTU (Serviço Mundial).
Para além dos vários cursos internos da BBC em jornalismo e administração, obteve o curso de Relações Públicas na City University e foi um dos primeiros alunos estrangeiros da Open University, em que frequentou Literatura do Séc. XIX, História e Psicologia. Foi também orador convidado em universidades e organizações governamentais, particularmente relacionadas com defesa e relações internacionais.
Homem de lutas como a famosa «Luta do Telex», numa altura em que se dependia deste meio para que os jornalistas enviassem os seus trabalhos para os jornais estrangeiros e a recém-privatizada British Telecom queria acabar com este serviço. A luta de Gilberto, membro fundador de um Grupo de Jornalistas Estrangeiros no Reino Unido, foi bem sucedida.
Era frequentemente convidado pelo governo britânico a iniciativas então inéditas como foi o caso de visitas a manobras tanto navais, (caso das manobras da NATO na Escócia, em Março de 1982, em que faziam parte tanto contratorpedeiros como porta-aviões, nomeadamente o Ark Royal e o Hermes da Marinha Real Britânica, que em Abril seguinte zarpariam para a Guerra das Falklands/Malvinas, Truffaut, da Marinha Real Belga e o navio-comandante Lossen da Marinha Real Dinamarqueza) como militares em terra, NATO e forças britânicas, tanto na Grã-Bretanha como na então Alemanha Federal, fazendo inclusivamente parte das últimas grandes manobras das forças da NATO nas proximidades de Rendsburg, Schleswig Holstein, no norte daquele país, e entrevistado tanto dirigentes políticos de várias nacionalidades como comandantes e secretários-gerais da NATO. No domínio da defesa, considera particularmente notável o convite, e encontro, com o então ministro britânico de defesa, actualmente Lorde King, nas vésperas da primeira invasão do Golfo, em Dezembro de 1990, em que, no seu gabinete foi confidente de importante informação sobre o Conflito, mas que, fiel às suas fontes, e sendo uma conversa "off the record", não a revelou.
Nos finais da década de 70 foi solicitado por diversas vezes pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros Britânico como tradutor e acompanhante em representação oficial britânica, de altas delegações oficiais Brasileiras, Angolanas, Moçambicanas, São Tomeenses e Cabo Verdianas. No caso do Brasil, altura em que o país passava por uma grave crise económica, Gilberto foi o contributo para que fossem efectuados empréstimos por parte de instituições financeiras britânicas.
Desde 1978 até 2005 foi correspondente do Jornal de Notícias, sendo o primeiro correspondente de um jornal português após o 25 de Abril. Durante 10 anos foi também correspondente da TSF e desde 1989 exerceu funções para a RTP quando solicitado.





MOMENTOS DE UMA CARREIRA


Por: Manuel de Sousa

Das muitas reportagens que Gilberto Ferraz produziu para a BBC e para os meio de comunicação portugueses destaca-se a cobertura para o Jornal de Notícias e para a TSF dos acontecimentos conturbados em Timor-Leste que tiveram grande importância na cobertura editorial da Secção Portuguesa, ao ter conhecimento que a Resistência Timorense ouvia atentamente, e gravava, as suas emissões, sendo o único contacto que mantinha com o exterior.




Destaca-se a cobertura contínua e em directo efectuada para a TSF do falecimento da Princesa Diana, desde o anúncio do seu falecimento, em Paris, assim como todos os momentos de dor e luto do povo britânico, até ao cortejo fúnebre do Palácio de Kesington e das exéquias na Abadia de Westminster.

Para a TSF existem outros destaques que marcaram a carreira de Gilberto Ferraz. A 09 de Setembro de 2000 acompanhou os protestos do aumento dos combustíveis em vários países da Europa, tendo Gilberto Ferraz traçado em pormenor o panorama vivido no Reino Unido, em que as principais companhias de abastecimento começaram a ficar vazias, como a Shell e a BP e o retrato da agressividade dos protestos em Stanlon, Milford, no País de Gales, no tempo em que Gordon Brown detinha a pasta das finanças.
A 10 de Julho de 2000, também para a TSF, Gilberto Ferraz acompanha os protestos da protestante Ordem de Orange com grande impacto em Belfast, onde as ruas estavam desertas e onde existiram estradas cortadas ao trânsito.
Já em 08 de Junho de 2005, retrata-nos a posição de Tony Blair em aproveitar o positivo da Constituição Europeia, num país que suspendeu a realização do referendo. Fez-nos um relato de toda a situação acerca das decisões e tomadas de posição na negociação da Constituição Europeia, no Reino Unido, depois de alguns referendos noutros países Europeus que disseram «não».

Para o Jornal de Notícias são de destacar outros acontecimentos como a 30 de Abril de 2004 em que retrata a chegada de José Mourinho para treinar o Chelsea e a 25 de Maio de 2005 anuncia a entrevista que o treinador dá à BBC. A 30 de Abril de 2005 retrata, para o JN, o estado de espírito do Reino Unido perante a morte de João Paulo II.
Nos tempos actuais em que o Reino Unido conhece as novas figuras de um novo governo minoritário, Gilberto retrata, em 07 de Fevereiro de 2005, o recorde de Tony Blair como chefe de governo pelo Partido Trabalhista, ao atingir os 7 anos e 279 dias.
David Kelly, o cientista Britânico que se terá suicidado num bosque de Oxford, por razões desconhecidas, mas devido às decisões tomadas em relação à Guerra no Iraque, foi acompanhada pelo JN, que fizeram titulo a 23 de Dezembro de 2004. Ainda sobre a Guerra do Iraque, em 2004, Gilberto Ferraz traça os acontecimentos relacionados com os motivos e os relatórios que levaram à ofensiva, onde se falava de armas de destruição maciça, que nunca foram encontradas. Os motivos de uma guerra que provocou baixa nas sondagens de Tony Blair.
A 08 de Dezembro de 2004 chegam notícias das tentativas no processo de paz na Irlanda do Norte, que haviam sido suspensas há três anos.
Como jornalista veterano que foi ao serviço da BBC, Gilberto Ferraz em Maio, Junho e Julho de 2004 retrata os períodos conturbados na História da BBC, assim como, das modificações que se registaram na estrutura, das greves e dos despedimentos.
Em Janeiro de 2005 numa reportagem para o JN é noticiado o destaque de Portugal na televisão britânica, com a transmissão em vários canais de programas prestigiantes acerca de diversas regiões portuguesas e do que por cá se pode encontrar de melhor.
Por fim, ainda de registo, a 6 de Junho de 2005, o acerco de António Champalimaud foi leiloado em Londres. O JN, por intermédio do seu correspondente Gilberto Ferraz, contou o decorrer do leilão, das obras leiloadas e dos valores obtidos.
Uma vida profissional recheadas de reportagens, acontecimentos e muitas histórias, em 45 anos de carreira registados no livro, a publicar, com o título «Por Terras de Sua Majestade».

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