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A vida tem muito para contar e partilhar com os demais. Esta é a minha rede social para partilhar histórias, momentos e pensamentos, a horas ou fora de horas, com e sem pés nem cabeça. Blogue de Manuel Joaquim Sousa
Num ano se conseguiu algo que nunca tinha acontecido até então: construiu-se do zero os cadernos eleitorais, as urnas, a logística para que, em todo o país, todos pudessem usar o seu novo direito cívico. A afluência às urnas foi de 91,7% de eleitores.
Volvidos quarenta anos muito mudou. O eleitorado perdeu a energia interventiva de Abril. A política perdeu o seu crédito. Os agentes políticos passaram a ser considerados como mediadores de interesses pessoais, corporativos e a política passou a ser entendida
Está prestes a fazer 40 que o povo usou a sua maior arma. Sim, a arma que lhe dá todo o poder para decidir o futuro que deseja para si, para os seus e para o seu país. O voto.
O voto é uma arma, da qual nenhum defensor da democracia deve prescindir no momento em que é chamado às urnas para decidir quem deseja que o governe. Esta é uma conquista de Abril, uma conquista muito cara – cinquenta anos de ditadura. É por isso, de extrema importância que as pessoas não ignorem o direito que deve ser entendido como um dever, mesmo que exista descontentamento com a política e com os políticos. Se defendemos a democracia é no voto que devemos expressar qualquer descontentamento em relação ao poder instalado. A abstenção não resolve nada. Apenas condena a conquista que agora comemora 40 anos e que constitui um desígnio de Abril.
Eu não vivi o 25 de Abril de 74; o pouco que sei é pelo que os mais velhos me contam, pelo que aprendi na escola ou por aquilo que vou lendo nos jornais e noslivros. Será sempre pouco perante todos os que tiveram oportunidade de o viver; no entanto, fica o desejo de ter vivido esse dia para perceber melhor a sua importância, apesar dos momentos conturbados e as dificuldades que se sucederam na frágil democracia. Comparando o 25 de Abril com outras revoluções que aconteceram pelo mundo, posso concluir que esta foi uma revolução sem igual na História; sem banhos de sangue, com o povo unido e sem grandes resistências. Talvez por isto chego mesmo a achar, com o peito cheio de orgulho, que os portugueses são um povo superior aos olhos do mundo, mesmo apesar de alguma preguiça com que nos querem rotular. Como dizia um ex-ministro pouco apreciado: "Os portugueses são o melhor povo do mundo".
Já passaram quarenta anos; receio que tenha passado tanto tempo e a memória da revolução se esteja a perder porque vão sendo cada vez menos aqueles que viveram esta data e os testemunhos se fiquem pelos registos nos livros de História.
Por vezes, penso que a liberdade é um bem adquirido, mas a realidade mostra-me que posso estar enganado; alguns estudos internacionais dizem que desde o ano 2000 as sociedades começaram a deixar de ser democráticas porque preferem um bom estado da economia em lugar de uma boa democracia.
Vivemos numa sociedade da informação, mas quanto mais acesso a ela temos, mais limitamos os horizontes do pensamento e somos conduzidos a ideias "standarizadas" por via de redes sociais e não só; em que a diferença é "olhada" com desconfiança e algum repudio; em que uso da liberdade por uns ofende a integridade do outro.
Quarenta anos se passaram do tempo de Abril e vemos que a liberdade do nosso povo é posta à prova todos os dias pelos ataques do poder central; cada vez mais as decisões vêm do capital; cada vez mais senhores que desconhecem o país real produzem leis com régua e esquadro, substituindo pessoas por números e percentagens.
Não podemos dizer que o 25 de Abril foi cumprido quando, dia após dia, se encerram escolas, hospitais, tribunais e tantos outros serviços públicos, condenando o futuro das pessoas, das freguesias e dos concelhos. Não se vive em democracia plena quando se perde o que demorou a ser conquistado e construído. Não se vive em democracia plena quando perdemos soberania à mercê de três intervenções externas para ajuda financeira como da Troika, tendo, esta última, provocado uma crise económica, social e financeira sem precedentes devido a má gestão de alguns Governos que vivem em alternância com o poder. Não foi para isso que serviu a revolução.
Pena que muitos cidadãos desvalorizem a revolução que lhes concedeu o direito ao voto e, perante esta crise e o descrédito do sistema político, preferem ficar no sossego, no conformismo da abstenção e da crítica fácil.
A democracia, ainda jovem, está doente por culpa de todos que a deixaram chegar a este estado; nós, os presentes nesta Assembleia, temos em mãos uma grande responsabilidade: o exemplo.
(o meu discurso, a 25 de Abril de 2014, na Assembleia Municipal de Terras de Bouro)
Era Sábado, 10 de Agosto, quando a estátua em honra do Cónego Melo foi edificada na rotunda de Monte D'Arcos, junto ao cemitério, em Braga. Ao que se fala tudo foi feito da forma mais rápida e discreta, já que se esperava alguma polémica em torno do assunto.
No Domingo, uma primeira reportagem da TSF no local permitiu conhecer as primeiras reacções das pessoas que passavam e ficavam a admirar o momento. “Acho bonito e fica bem”, ou “só deveriam pôr quando fosse para inaugurar” eram algumas das expressões repetidas ao longo do dia. Porém, muitos outros manifestam o seu descontentamento perante a figura exposta, mas ainda não inaugurada.
Os protestos fazem-se sentir por grupos ligados ao PCP e ao BE e pessoas que não vêem no Cónego Melo uma pessoa de bem – conhecido por apoiar a ditadura do estado Novo, por ser o responsável pelo incêndio do Centro de Trabalho do PCP, em Braga, entre outros assuntos polémicos e bem quentes da História recente, exemplo do caso Padre Max, e ataques bombistas no Verão de 1975. O descontentamento é transversal ao PCP e BE, pois o PSD e CDS abstiveram-se na votação de Assembleia Municipal da proposta para a homenagem. Já em 2002 existiu uma tentativa de aprovação de uma homenagem que não foi aceite, tendo a estátua permanecido guardada alguns anos até uma outra altura que veio agora ser mais propícia. Entretanto, O Cónego Melo gerou novamente polémica, quando foi inaugurada uma pintura na Cripta do Sameiro, onde o referido Cónego estava no altar juntamente com três Papas e a Nossa Senhora do Sameiro.
Por muito que se tente criar consenso em torno de pessoas que tiveram o seu relevo na cidade, existe a necessidade de respeitar a memória de todos. É certo que Deus não agradou a toda a gente, é certo que nem todas as pessoas homenageadas em estátuas e tabuletas são de unanimidade geral, porém, podem sempre gerar algum consenso geral para a merecida homenagem – o que não é o caso.
Até poderíamos estar perante criticas inflamadas de algumas facções políticas, mas apenas o Partido Socialista terá aprovado, o que consideramos que existe uma grande distância de um consenso.
Se o país deve reconhecer feitos democráticos e condenar o todas as forma de terrorismo, fascismo e ditadura, o município deveria pensar sobre o impacto em muitas famílias que este assunto iria causar, ainda que a personalidade tenha desempenhado um papel importante na região ou no país.
Os protestos em torno da estátua devem continuar, falta saber o que decidirá a autarquia, se atender aos manifestantes, se deixar a “poeira assentar” para uma inauguração posteriormente.
Notícia no Público em: http://www.publico.pt/local/noticia/manifestantes-prometem-voltar-enquanto-a-estatua-do-conego-melo-permanecer-em-braga-1602930
A madrugada já está crescida, já é uma senhora bem madura com filhos para criar; mas ao fim de 39 anos, ainda se sente ansiosa por realizar o seu desejo, o desejo de concretizar Abril. Uma infância que parecia tribulada, cheia do medo da madrasta ditadura e sempre agarrada à prima democracia, que nasceu no mesmo dia. As primas, por vezes, estão juntas, mas em muitas outras vezes seguem o destino oposto como mandam os senhores do poder.
A madrugada segue só o seu caminho e desiludida com o amanhã que se constrói porque os seus filhos vivem medos, frustrações, desalentos e desorientações em relação ao dia que daí a pouco se levanta. À madrugada faltam as vozes que gritam na rua por um novo amanhã e um novo Abril; o Abril libertador que todos desejam como um crente que anseia pelo seu Messias. A madrugada sente a fraqueza das vozes dos seus filhos que ora gritam, ora se calam como que rendidos às circunstâncias do momento porque lhes faltam as ideias e a capacidade de caminharem independentes como a sua mãe decidiu caminhar quando se separou com a prima da madrasta ditadura.
Até quando a saudosa e saudosista madrugada será capaz de aguentar o desalento de encontrar e concretizar o tão desejado Abril?
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