Mas, perante as mudanças do mundo laboral cada vez mais precário, que força e que garantias nos oferecem os sindicatos? Será que se tornaram em organizações institucionalizadas, que apenas trabalham em gabinetes mantidos pelas contribuições de quem trabalha ou terão a capacidade de se tornarem em organizações de luta unida e sejam a voz daqueles que precariamente não se podem manifestar?



Por: Manuel de Sousa
manuelsous@vodafone.pt


1 - A rua é o velho dilema de cada Governo e muito mais o dilema do Primeiro-Ministro José Sócrates. Ao governo que cede às pressões da rua acusa-se de executivo frágil e sem capacidade de fazer as reformas que o país necessita. Ao Governo que ignora as vozes da contestação acusa-se de um executivo sem sentido democrático. Nos dois mandatos de um Governo PS assistimos a muito de mau e de muito mau, que o bom que possa ter feito pouco notável se tornou. Independentemente disso, o PS conseguiu uma vitória relativa para continuar a governar o país. Se num primeiro mandato as contestações sociais foram capazes de dominar a actividade mediática e política, num segundo mandato, as contestações continuam a dominar e a subir de tom pela oposição, ainda que credível ou não, e pela opinião pública que continua a mostrar-se cada vez mais insatisfeita e intolerável perante a situação económica em que vivemos.

2 - A actual situação económica é deveras delicada, tanto mais quanto mais dependemos da ajuda internacional para sair do buraco que cavamos e que nos ajudaram a cavar. Não sabemos ao certo até que ponto pode ir a situação social e económica de Portugal porque não vemos que se tomem medidas eficazes que permitam a melhoria do nosso estado. As medidas que temos vindo a conhecer, tomadas pelo Governo para o Orçamento de Estado de 2011, são mais do mesmo, das mesmas medidas que se vêm tomando de uns anos a esta parte. A receita é sempre a mesma, mais impostos, nível de vida mais caro para uma classe baixa em miséria e uma classe média que tende a ficar extinta. As medidas são as mesmas que ao longo dos anos têm provocado a falência de empresas e têm destruído o tecido produtivo português.

3 - Os portugueses pouco acreditam naqueles que governam, que anunciam a justiça social e em lugar disso provocam o aumento das dificuldades de quem menos pode para permitir que outros possam estar intocáveis à crise. É nesta base que se prepara uma Greve Geral, acordada com as várias centrais sindicais e que prometem parar o país, no dia 24 de Novembro próximo. As últimas greves tiveram uma expressão reduzida, falta saber se a Greve Geral de 2010 será tão marcante como a de 1988, em que o país foi seriamente afectado por uma paragem em grande parte dos sectores de actividade económica. Em 1988 a greve foi convocada devido à possibilidade de aprovação de um pacote laboral penalizador para os trabalhadores. Esse pacote laboral foi aprovado pelo Governo de Cavaco Silva em maioria na Assembleia da República, mas chumbado pelo então Presidente da República Mário Soares, o que obrigou que o diploma fosse para o Tribunal Constitucional e algumas das propostas fossem alteradas de acordo com o diploma inicial por serem inconstitucionais.
A actual situação económica será diferente de 1988, o que motiva a Greve Geral de 2010 será bem diferente dessa data, mas os manifestantes são os mesmos, os trabalhadores. Aqueles que pagam a crise e a gestão do Estado e do Governo com o seu salário. A Greve Geral é também uma forma de protesto para as entidades patronais que não cumprem a lei e submetem os trabalhadores a horários acima dos estipulados sem o pagamento adicional, sem o pagamento de todos os direitos e regalias consagradas no Código do Trabalho, por aqueles que tentam fugir às suas contribuições sociais, por aqueles que não asseguram condições de higiene/segurança no trabalho, por aqueles que tratam os seus trabalhadores de forma desumana e sem compreensão para as dificuldades que cada um atravessa. São muitos os empregados que aguardam por salários em atraso e mesmo assim trabalham a acreditar por melhores dias. Não é compreensível que nos dias de hoje os trabalhadores tenham de fazer vigílias à porta das fábricas para impedir a saída de máquinas com destinos a outras paragens. Assim como, não se compreende que empresas se aproveitem das ajudas do Estado e depois saiam do país com todo o dinheiro no bolso pago pelos contribuintes. Se as pessoas vivem nestas condições têm que manifestar, embora vivam no medo das represálias e pressões posteriores por terem exercido esse direito, o direito à greve. Um trabalhador que cumpra com os seus deveres e regras estabelecidas tem por direito ser tratado com dignidade. Existem empresas de sucesso, que sobrevivem à crise porque ao cumprir as suas obrigações para com os empregados e para com o Estado, obtêm dos seus trabalhadores empenho, dedicação e lealdade.
Esta Greve Geral é uma forma de protesto contra o Governo que permite passivamente a instabilidade e a precariedade laboral e pelas medidas tomadas que aumentam ainda mais as dificuldades das pessoas e das empresas que tentam cumprir os seus deveres e por isso estão as ser atrofiadas. Este é um protesto contra o Capitalismo desregulado que gerou esta situação, de alguns anos a esta parte, e que minou toda a economia, de forma que a mesma se tornasse dependente de si. Falo dos créditos e produtos financeiros duvidosos, das Agências de Rating que controlam as economias nacionais, de toda a economia paralela e invisível que se gerou e tornou cada um cada vez mais dependente. Protesto contra a UE, que também tem a sua responsabilidade ao gerir-se sob um modelo pouco credível e que beneficiou apenas alguns países a projectarem-se, enquanto que, os outros tivessem de estar a reboque sem qualquer capacidade de discussão, opção e liberdade económica.


4 - Numa altura em que nos aproximamos de uma Greve Geral convocada pelas Centrais Sindicais, questiono cada vez mais a importância dos Sindicatos no mundo do laboral e a sua capacidade de subsistência futura. O movimento sindical é sem dúvida a força que garante a luta e organização dos trabalhadores para a procura de condições laborais condignas de cada um. Mas, perante as mudanças do mundo laboral cada vez mais precário, que força e que garantias nos oferecem os sindicatos? Será que se tornaram em organizações institucionalizadas, que apenas trabalham em gabinetes mantidos pelas contribuições de quem trabalha ou terão a capacidade de se tornarem em organizações de luta unida e sejam a voz daqueles que precariamente não se podem manifestar? Talvez a Greve e o pós-greve, de dia 24 de Novembro, traga alguma resposta.
Será que, tal como Cavaco Silva em 1988, José Sócrates vai ignorar a voz da rua, voz de indignação para a actual situação económica? Da minha parte, nas minhas palavras mostrarei sempre a indignação perante este Governo, ainda que elas pouco eco possam ter naqueles que estão na cadeira do poder.