12 ANOS ESCRAVO PODERIA SER UMA HISTÓRIA DOS NOSSOS DIAS.
Há filmes que nos marcam ou nos deixam a pensar sobre a forma como os humanos se tratam e a necessidade de serem seres superiores, mesmo entre si – fazendo da raça uma forma de seleção. “12 Anos Escravo” – que acabo de ver há momentos no cinema – é uma história verídica, do século XIX, nos EUA, de um homem negro, com família, que perde a sua liberdade e é transformado num escravo. No decorrer da história são recorrentes as agressões físicas e morais dos brancos sobre os negros, com cenas de dor e sofrimento cru, sem que se tenham poupado nas imagens terríveis – os atos de violência e as marcar que ficam.
É incrível como a raça humana se pretende distinguir e procure encontrar na moral fundamentos para isso. Neste filme é bem patente a interpretação que o branco faz das Escrituras, como se Elas ditassem a lei que os favorece em relação aos negros e como extinguem Deus do que é sua propriedade – os escravos – e sejam estes os responsáveis pelo que de bom ou mau acontece ao mundo.
A escravatura existe desde os primórdios da História, esteve na base de muitas civilizações e impérios – o império português também marca aqui a sua presença com o tráfico de seres humanos, desde a altura dos descobrimentos até à entrega das suas colónias.
Felizmente que o mundo mudou e hoje vivemos em tempos de liberdade – ainda que a igualdade esteja aquém do desejado -, pelo menos nas nossas sociedades, pois sabemos que a escravatura ainda não foi erradicada em diversos lugares do mundo. Sabemos que em terras de África, em países da Ásia e não só, a escravatura continua como se estivéssemos parados no tempo; são homens e mulheres que trabalham sem quaisquer condições laborais ou sem qualquer proteção social e de saúde, para além dos salários miseráveis que auferem. São aos milhares. Todos, nós os do mundo dito evoluído, bem sabemos, embora assobiemos para o lado como se fosse um problema que a nós não nos interessa. Sabemos bem que os escravos de hoje são aqueles que produzem e alimentam o consumo de outros, que buscam produtos em quantidade e de baixo custo. Apenas se fala desta gente quando um prédio cai e lá dentro morrem centenas de trabalhadores que confecionam roupa para grandes cadeias de distribuição.
Há uns meses atrás, vi uma reportagem na SIC Notícias sobre a escravatura em África, nas culturas do cacau para as grandes marcas mundiais de chocolate. Não sabia eu, e muita gente não sabe, que comemos chocolate fabricado por algumas marcas que “pagam” a escravatura em países onde as crianças não sabem o que é ir à escola e que são deliciadas com agressões físicas.
“12 Anos Escravo” é um bom filme, daqueles que apesar de retratar outra época nos deve apelar à consciência: a liberdade é algo muito valioso que todas as sociedades devem preservar; e não podemos esquecer que este drama ainda existe e nós indiretamente pactuamos com ele, pois ignoramos uma escravatura que está bem presente e convive com o consumismo dos nossos tempos.
E tu, és livre ou serás também escravo, escravo do tempo?